29/08/2024 – 07:59
Fabiano Bastos/Embrapa
Proposta vai incentivar projetos sustentáveis
O Projeto de Lei 1725/24 traz ainda um programa para estimular a vinda de recursos externos direcionados a projetos considerados “verdes”, usando linhas de crédito abertas com dinheiro do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (FNMC).
Segundo o texto, que repete a Medida Provisória 1213/24, o programa Eco Invest Brasil pretende incentivar investimentos em projetos de transição para práticas e tecnologias sustentáveis, de adensamento tecnológico, de bioeconomia, de economia circular, de transição energética e de infraestrutura e adaptação à mudança do clima, entre outros.
Após a captação de 2 bilhões de dólares ano passado (cerca de R$ 10,5 bilhões) por meio da venda no exterior de “green bonds” (títulos soberanos brasileiros com recursos vinculados a projetos sustentáveis), o fundo passou a contar com esse dinheiro para 2024 e com os de captações futuras de títulos semelhantes.
Haverá ainda participação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Banco Mundial. Por ter grau de investimento qualificado (AAA), o BID vai contratar instrumentos de proteção cambial no exterior e repassá-los, por meio do Banco Central, para instituições financeiras no Brasil participantes do Eco Invest. Inicialmente, estão previstos 3,4 bilhões de dólares (cerca de R$ 17 bilhões) para essa proteção cambial e mais 2 bilhões de dólares (cerca de R$ 10,5 bilhões) para o FNMC, ao qual o Banco Mundial deverá direcionar outro bilhão de dólares (R$ 5 bilhões).
A “ginástica financeira” é necessária para o mercado brasileiro conseguir oferecer proteção cambial (hedge cambial) com custos acessíveis para investidores nesses projetos, cujo retorno do capital investido (em dólar) é longo e obtido em moeda local (reais). Sem a proteção cambial, o investidor não é atraído a internalizar os recursos no Brasil porque uma variação significativa no câmbio (desvalorização do real) pode resultar em prejuízos.
Esse é o caso, por exemplo, de projetos de hidrogênio verde para exportação que empresas estrangeiras pretendem implantar no Nordeste.
Programa Acredita
Mudança feita pelo relator, deputado Doutor Luizinho, permite o uso desses mesmos mecanismos cambial e de captação de recursos externos para financiar o programa Acredita no Primeiro Passo.
Linhas de capital
O Eco Invest terá quatro linhas de capital sustentadas com recursos do FNMC, cuja administração caberá a um Comitê Executivo controlado pelo Ministério da Fazenda, podendo ter a participação de outros órgãos, como o Ministério do Meio Ambiente, que cuida do Comitê Gestor do fundo.
As instituições financeiras interessadas em acessar os recursos deverão se habilitar apenas se suportarem os riscos das operações de financiamento ou hedge (diferença de câmbio), podendo ser estabelecidos mecanismos para competição entre os agentes financeiros.
O Ministro da Fazenda definirá normas como critérios de seleção e habilitação, volumes e limites de alocação dos recursos, forma e periodicidade da prestação de contas e outros aspectos operacionais. O Banco do Brasil poderá ser contratado, com dispensa de licitação, para dar apoio operacional ao programa.
Tipos de operações
Os bancos que acessarem a linha do Eco Invest poderão utilizá-la para oferecer ou viabilizar a oferta de:
- operações de crédito em montante parcial dos recursos demandados pelo projeto de investimento apoiado (blended finance);
- operações de crédito para casos relacionados a eventos de volatilidade cambial que possam comprometer a liquidez da empresa ou do investidor;
- instrumentos derivativos cambiais, incluídos opções, futuros e swaps com o objetivo de mitigar, parcial ou integralmente, o risco cambial do investidor (hedge cambial); e
- financiamento de estudos e projetos para estruturar a exportação de produtos e serviços, a infraestrutura de suporte para isso ou a oferta de infraestrutura e serviços para atrair turismo sustentável internacional ao País
Capital externo e interno
Quanto à sublinha de financiamento parcial (blended finance), o Conselho Monetário Nacional (CMN) já editou resolução regulamentando as regras. Ela funcionará com leilões organizados pela Secretaria do Tesouro Nacional, momento no qual as instituições financeiras terão de demonstrar capacidade de mobilizar capital externo dentro de, no máximo, 24 meses.
Após a homologação do leilão, 25% dos recursos serão liberados ao vencedor. Se ele captar, nos 12 meses seguintes, um mínimo de 25% do capital externo previsto, poderá pedir o desembolso de mais 50% o empréstimo via FNMC.
Quando comprovada a captação de um mínimo de 75% do capital externo previsto, a instituição financeira poderá acessar o restante do financiamento.
A taxa normal do empréstimo que o banco deverá pagar ao FNMC será de 1% ao ano com dez anos de amortização. No entanto, haverá taxas de penalidade se não forem cumpridos os prazos de captação dos recursos externos:
- se após 12 meses do repasse não comprovar a captação de 25% de capital externo, a instituição financeira terá de devolver o recurso ao fundo, proporcionalmente ao valor do capital externo que não captou, remunerado pela taxa Selic, calculada desde a data do recebimento do desembolso até a data da devolução;
- quando atingidos 18 meses do repasse, a parcela do empréstimo recebida, proporcionalmente ao valor não captado no exterior, poderá ser mantida ou devolvida pela instituição financeira, mas a remuneração, em ambos os casos, será pela taxa Selic, desde a data do recebimento até a data da captação do dinheiro no exterior ou até a data de devolução, que passará a ser de 24 meses nesse caso;
- passados os 18 meses e comprovada a captação de capital externo prevista no leilão, a taxa efetiva de juros será de 1% ao ano; e
- caso não haja captação total dos recursos externos aos 24 meses, a instituição financeira deverá devolver a parcela do empréstimo recebida, proporcionalmente ao valor não captado no exterior, remunerada à taxa Selic desde a data do recebimento do desembolso até a data da devolução.
Dessa forma, a regra estimula a estruturação de compromissos firmes de aporte de capital estrangeiro a fim de evitar o pagamento de taxas muito maiores que 1% ao ano.
Caberá ao Banco Central acompanhar e fiscalizar os atos dos bancos no acesso e na operação da linha do Eco Invest, devendo receber denúncias de outros órgãos e entidades da administração pública federal que verificarem aplicação irregular do dinheiro.
Aquelas instituições financeiras que comprovadamente aplicação irregularmente os recursos públicos ou o fizerem em finalidades distintas deverão devolvê-los acrescidos de taxa Selic mais 1,5% a.a., calculados do desembolso até a data da devolução.
Swap cambial
O PL 1725/24 traz ainda outro dispositivo que permitirá ao Banco Central oferecer ao mercado swap cambial com prazo mais longo, além de um ano.
Nesses swaps cambiais, o Banco Central paga ao investidor quando a cotação do dólar sobe. Quando a cotação do dólar cai, é o investidor quem paga ao BC.
Mas esses não são os únicos valores envolvidos nessas operações. No leilão de venda desses papéis, é definido o chamado cupom cambial, uma remuneração que o Banco Central paga ao investidor por carregar um investimento, referenciado em moeda estrangeira, mas liquidado em reais.
Atualmente, no prazo médio dos swaps que o BC coloca em mercado, de seis meses, o cupom tem um sobrepreço de cerca de 1% sobre os juros vigentes no mercado internacional.
Com estoque de swaps cambiais em torno de 100 bilhões de dólares (R$ 500 bilhões), o encargo provoca uma despesa anual de cerca de R$ 5 bilhões para o BC manter a oferta de proteção cambial ao mercado.
A ideia é paulatinamente alongar o perfil de prazo desses swaps a fim de criar uma curva mais longa de câmbio no Brasil.
No entanto, especialistas no mercado questionam que, pelo fato de o Banco Central ser o principal ofertante desse tipo de instrumento de proteção, ele acaba por si só influenciando a formação do preço do encargo (cupom cambial), que assim não seria ajustado para menor.
Reportagem – Eduardo Piovesan
Edição – Roberto Seabra